terça-feira, 19 de junho de 2012

O Dossiê dos Mortos e Desaparecidos a partir de 1964

   A publicação do Dossiê dos Mortos e Desaparecidos Políticos a partir de 1964 surgiu da sistematização das pesquisas nos arquivos do IML em São Paulo, Rio de Janeiro e Pernambuco; nos arquivos do DEOPS de Pernambuco, Paraná, Paraíba, São Paulo e Rio de Janeiro; nos arquivos do Instituto de Criminalística Carlos Éboli; nos documentos do projeto Brasil: nunca mais e, também na imprensa. Os arquivos do DEOPS de Minas Gerais, segundo autoridades governamentais daquele estado, foram incinerados e não puderam ser consultados. O debate público sobre os mortos e desaparecidos políticos e os arquivos policiais, num momento em que a imprensa mundial discutia a abertura dos arquivos das polícias políticas no Leste Europeu, ampliou o interesse pelo tema e permitiu assim, a publicação do Dossiê. Foi possível, mais uma vez, alertar a sociedade sobre os perigos das ditaduras e para a necessidade de se eliminar a prática da tortura.
No Dossiê estão reunidas as informações organizadas durante as pesquisas, as conversas e troca de correspondência com parentes, amigos e ex-presos políticos. Destaca-se o depoimento da ex-presa política Inês Etienne Romeu, quando, após a anistia, denunciou a existência da "Casa da Morte", aparato clandestino da repressão política localizado em Petrópolis (RJ), testemunhando a passagem e assassinato de diversos presos desaparecidos. Desde 1990 foi solicitada às famílias uma biografia de seus parentes, mas nem todos responderam; por isso, em alguns casos foi possível contar um pouco da vida daquelas pessoas, em outros, publicou-se somente a denúncia da morte.
Os nomes encontrados no Dossiê estão agrupados na classificação utilizada desde os anos 70: "Mortes Oficiais"; "Desaparecidos no Brasil"; "Desaparecidos no exterior"; "Mortes no exílio", onde estão as pessoas que, forçadas ao exílio entre 1964 e 1979, morreram longe de seu país. Há ainda "Outras mortes", que apresenta casos de falecimento em conseqüência da repressão, tais como seqüelas de torturas, suicídios ou acidentes. Dentre os desaparecidos no Brasil, Noberto Armando Habeger, o padre Jorge Oscar Adur e Ernesto Ruggia são argentinos; Paulo Stuart Wright e Stuart Edgar Angel Jones tinham dupla cidadania, americana e brasileira; Libero Giancarlo Castiglia e Antônio Benetazzo possuiam cidadania italiana e brasileira. Não constam do Dossiê os milhares de trabalhadores rurais assassinados. Os levantamentos realizados pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) entre 1º de abril de 1964 e 31 de dezembro de 1993 registram 1.781 assassinatos de camponeses, dos quais somente 29 foram a julgamento e, em apenas 14 casos houve condenações. O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra registrou 1.188 assassinatos de 1964 a 1986. Não fazem parte do Dossiê as centenas de índios brasileiros assassinados em conflitos de terra. A impunidade dos crimes políticos se perpetua nas mortes cotidianas, por meio das chacinas, massacres e outras arbitrariedades cometidas por policiais, grupos de extermínio e seus mandantes.
Os familiares e as entidades defensoras dos direitos humanos têm colocado nomes de mortos e desaparecidos políticos em logradouros públicos, creches e escolas em São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, Belo Horizonte e Porto Alegre. O Grupo Tortura Nunca Mais/RJ criou, em 1989, a Medalha Chico Mendes de Resistência para homenagear, anualmente, no dia 31 de março, 10 pessoas e entidades que tenham se destacado nas lutas de resistência no Brasil e América Latina; entre os agraciados estão 31 mortos e desaparecidos. Essa medalha foi instituída no ano em que o Comando Regional do Leste, antigo I Exército, homenageou com a Medalha do Pacificador, comemorando o 25º aniversário do golpe militar de 1964, vários conhecidos integrantes do aparato de repressão dos anos 60 e 70.

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